DIREITO ADMINISTRATIVO:
AGENTES PÚBLICOS
Inf. 809/2024. Comprovação de transação administrativa. Pagamento da vantagem de 28,86%. Aplicação do art. 7º, § 2º, da MP n. 2.169-43/2001. Documentos expedidos unilateralmente pelo SIAPE. Comprovação das transações celebradas anteriormente à MP. Impossibilidade.
I) É possível a comprovação de transação administrativa, relativa ao pagamento da vantagem de 28,86%, por meio de fichas financeiras ou documento expedido pelo Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos – SIAPE, conforme art. 7º, § 2º, da MP n. 2.169-43/2001, apenas em relação a acordos firmados posteriormente à vigência dessa norma.
II) Quando não for localizado o instrumento de transação devidamente homologado, e buscando impedir o enriquecimento ilícito, os valores recebidos administrativamente, a título de 28,86%, demonstrados por meio dos documentos expedidos pelo SIAPE, devem ser deduzidos do valor apurado, com as atualizações pertinentes.
REsp 1.925.190-DF, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 18/4/2024, DJe 26/4/2024 (Tema 1102).
Caso: A Medida Provisória n. 1.704/1998 estendeu aos Servidores Públicos Civis da Administração Direta, Autárquica e Fundacional do Poder Executivo Federal a vantagem de 28,86%, objeto da decisão do Supremo Tribunal Federal assentada no julgamento do Recurso Ordinário no Mandado de Segurança n. 22.307-7-DF. Após sucessivas reedições e adiamentos da data limite para celebrar a transação, a MP 1.962-33/ 2000, inseriu o §2º no art. 7º, que foi reproduzido na vigente MP 2.169-43/2001, e se encontra eficaz até os dias atuais.
Pontos importantes:
Transação:
- A transação é negócio jurídico previsto no art. 840 e seguintes do Código Civil, segundo o qual os interessados, mediante concessões recíprocas, encerram ou previnem litígio, extinguindo as obrigações.
- No âmbito do Direito Público, é possível a transação de dívida mediante prévia autorização legislativa e demonstração da preservação do interesse público. No entanto, a autorização legislativa para que a Administração Pública possa transacionar é dirigida à Administração, e não ao particular.
- O art. 842 do Código Civil é expresso em dizer que se a transação se referir a direitos discutidos em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado pelos transigentes e homologado pelo juiz. Somente a escritura pública e o ajuste assinado por ambos os transigentes, e homologado judicialmente, é que seriam aceitos.
Negócio jurídico. Forma.
- O art. 104, III, do Código Civil, é no sentido de que a validade do negócio jurídico requer a observância da forma prescrita ou não defesa em lei. Este é o caso, considerando que a escritura pública e o ajuste assinado são requisitos formais para a validade da transação de divergências postas em juízo.
- Trata-se de norma de direito material, e não processual, razão pela qual não pode ser aplicado aos processos em curso.
SIAPE
- O SIAPE é um sistema que busca centralizar e unificar todas as plataformas de gestão da folha de pessoal dos servidores públicos federais. “Hoje o SIAPE processa o pagamento de servidores, regidos tanto pelo Regime Jurídico Único Federal (Lei n. 8.112/90) quanto pela CLT e por outros regimes (Contratos Temporários, Estágios, Residência Médica, etc)”.
- O extrato do SIAPE é documento público, o qual goza de presunção juris tantum de veracidade acerca de todas as informações nele reportadas. Um extrato interno da Administração Pública demonstra apenas um pagamento.
Inovação da forma trazida pela MP 1.962-33/2000 e MP 2.169/2001.
- A disposição contida no art. 7º, § 2º, da MP n. 1.962-33/2000, que foi reproduzida na vigente MP n. 2.169-43/2001, criou uma forma de demonstração da existência do negócio jurídico, que anteriormente era feito por meio da apresentação da escritura pública ou instrumento de transação assinado por ambos os acordantes.
- A referida forma é válida, já que criada por lei. No entanto, somente pode ser aplicada aos negócios jurídicos celebrados após a sua edição, sob pena de surpreender os envolvidos e retroagir de forma prejudicial ao administrado, de modo que a comprovação, por meio dos extratos do SIAPE, deve ser aplicada a apenas aos acordos firmados após a sua vigência.
Conclusão: Entende-se que é possível a comprovação de transação administrativa, relativa ao pagamento da vantagem de 28,86%, por meio de fichas financeiras ou documento expedido pelo SIAPE, conforme o art. 7º, § 2º, da MP n. 2.169-43/2001, apenas em relação a acordos firmados em momento posterior à vigência dessa norma.
Legislação citada:
CF. Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (…).
CC. Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.
CC. Art. 840. É LÍCITO aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.
CC. Art. 842. A transação far-se-á por escritura pública, nas obrigações em que a lei o exige, ou por instrumento particular, nas em que ela o admite; SE recairsobre direitos contestados em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado pelos transigentes e homologado pelo juiz.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Inf. 809/2024. Improbidade administrativa. Superveniência da lei n. 14.230/2021. Responsabilização por dolo genérico. Revogação. Aplicação imediata.
É possível a aplicação da Lei n. 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso.
REsp 2.107.601-MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024.
Caso: Necessidade da presença do elemento subjetivo dolo específico pela Lei 14.230/2021 para configurar ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública.
Pontos importantes:
Retroatividade: Item 3 da Tese do Tema n. 1.199 do STF consta que “a nova Lei n. 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente”
Elemento subjetivo dolo: A conduta ímproba escorada em dolo genérico (tema ainda não examinado pelo Supremo) também foi revogada pela Lei n. 14.230/2021, pelo que deve receber rigorosamente o mesmo tratamento.
Revogação: Condutas tipificadas nos incisos I e II da LIA.
Conclusão: Segundo o STJ, deve-se seguir a mesma diretriz do Tema 1199 do STF em relação às condutas antes tipificadas nos incisos I e II da LIA.
Legislação mencionada:
LIA. Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
I –
praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;I – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
II –
retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
GRATUIDADE DA JUSTIÇA
Inf. 809/2024. Honorários periciais. Antecipação pelo INSS. Sucumbência do beneficiário da justiça gratuita. Responsabilidade do Estado pela despesa. Dever de garantir o acesso à justiça e de prestar assistência judiciária.
Nas ações de acidente do trabalho, os honorários periciais, adiantados pelo INSS, constituirão despesa a cargo do Estado, nos casos em que sucumbente a parte autora, beneficiária da isenção de ônus sucumbenciais, prevista no § único do art. 129 da Lei n. 8.213/1991, sendo desnecessário o ajuizamento de ação autônoma para tanto.
REsp 2.126.628-SP, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.
Pontos importantes: Tema 1044/STJ – nas ações de acidente do trabalho, os honorários periciais, adiantados pelo INSS, constituirão despesa a cargo do Estado, nos casos em que sucumbente a parte autora, beneficiária da isenção de ônus sucumbenciais, prevista no parágrafo único do art. 129 da Lei n. 8.213/91.
Legislação citada:
CPC. Art. 82. Salvo as disposições concernentes à gratuidade da justiça, incumbe às partes prover as despesas dos atos que realizarem ou requererem no processo, antecipando-lhes o pagamento, desde o início até a sentença final ou, na execução, até a plena satisfação do direito reconhecido no título.
§ 1º Incumbe ao autor adiantar as despesas relativas a ato cuja realização o juiz determinar de ofício ou a requerimento do Ministério Público, quando sua intervenção ocorrer como fiscal da ordem jurídica.
§ 2º A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou.
Lei 8.213/1990. Art. 129. Os litígios e medidas cautelares relativos a acidentes do trabalho serão apreciados:
I – na esfera administrativa, pelos órgãos da Previdência Social, segundo as regras e prazos aplicáveis às demais prestações, com prioridade para conclusão; e
II – na via judicial, pela Justiça dos Estados e do Distrito Federal, segundo o rito sumaríssimo, inclusive durante as férias forenses, mediante petição instruída pela prova de efetiva notificação do evento à Previdência Social, através de Comunicação de Acidente do Trabalho–CAT.
§ único. O procedimento judicial de que trata o inciso II deste artigo é isento do pagamento de quaisquer custas e de verbas relativas à sucumbência.
EXECUÇÃO FISCAL
Inf. 809/2024. Execução fiscal. Penhora de faturamento. Evolução legislativa e jurisprudencial a respeito de sua caracterização como medida excepcional e da necessidade de esgotamento das diligências para localização de outros bens. Análise à luz do CPC/1973 e das modificações introduzidas pelo CPC/2015. Impossibilidade de equiparação à penhora de dinheiro. Critérios para aplicação do princípio da menor onerosidade. Tema 769.
I – A necessidade de esgotamento das diligências como requisito para a penhora do faturamento foi afastada após a reforma do CPC/1973 pela Lei n. 11.382/2006.
II – No regime do CPC/2015, a penhora do faturamento, listada em décimo lugar na ordem preferencial de bens passíveis de constrição judicial, poderá ser deferida após a demonstração da inexistência dos bens classificados em posição superior, ou, alternativamente, se houver constatação, pelo juiz, de que tais bens são de difícil alienação; finalmente, a constrição judicial sobre o faturamento empresarial poderá ocorrer sem a observância da ordem de classificação estabelecida em lei, se a autoridade judicial, conforme as circunstâncias do caso concreto, assim o entender (art. 835, § 1º, do CPC/2015), justificando-a por decisão devidamente fundamentada.
III – A penhora de faturamento não pode ser equiparada à constrição sobre dinheiro.
IV – Na aplicação do princípio da menor onerosidade (art. 805 e § único do CPC/2015; art. 620 do CPC/1973): a) a autoridade judicial deverá estabelecer percentual que não inviabilize o prosseguimento das atividades empresariais; e b) a decisão deve se reportar aos elementos probatórios concretos trazidos pelo devedor, não sendo lícito à autoridade judicial empregar o referido princípio em abstrato ou com base em simples alegações genéricas do executado.
REsp 1.835.865-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 18/4/2024 (Tema 769).
Caso: penhora do faturamento empresarial.
Pontos importantes:
Evolução legal e jurisprudencial do tema:
- Atualmente, novo CPC, de 2015, o legislador estabeleceu uma ordem preferencial ao identificar treze espécies de bens sobre os quais recairá a penhora, listando a penhora sobre o faturamento na décima hipótese (CPC, art. 835, X).
Penhora sobre o faturamento (CPC, art. 835):
- A penhora sobre o faturamento, atualmente, perdeu o atributo da excepcionalidade, pois concedeu-se à autoridade judicial o poder de – respeitada, em regra, a preferência do dinheiro – desconsiderar a ordem estabelecida no art. 835 do CPC e permitir a constrição do faturamento empresarial, consoante as circunstâncias do caso concreto (que deverão ser objeto de adequada fundamentação do juiz).
- Outra modificação prevista na lei é que, mesmo que o juiz verifique que os bens sujeitos à penhora não se caracterizem como de difícil alienação, isso não impedirá a efetivação de penhora do faturamento se o juiz constatar que são eles (tais bens) insuficientes para saldar o crédito executado.
- A penhora de faturamento não pode ser equiparada à constrição sobre dinheiro (LEF e CPC/2015);
- A autoridade judicial, ao decidir pela necessidade e/ou conveniência da efetivação de medida constritiva sobre o faturamento empresarial, estabeleça percentual que, à luz do princípio da menor onerosidade, não comprometa a atividade empresarial.
Princípio da menor onerosidade
- Previsão no art. 805 do CPC;
- O STJ já teve oportunidade de definir que o princípio da menor onerosidade não constitui “cheque em branco”;
- O juiz ao decidir com base no princípio da menor onerosidade ao devedor deverá fundamentar e se pautar em elementos probatórios concretos trazidos pela parte a quem aproveita (in casu, pelo devedor), não sendo lícito à autoridade judicial aplicar em abstrato o referido dispositivo legal, com base em simples alegações da parte devedora.
Conclusão: é possível a realização direta da penhora sobre o faturamento da empresa, desde que respeitada as seguintes diretrizes:
Regra: Ordem de preferência do dinheiro (CPC, art. 835);
Excepcionalmente: A constrição judicial sobre o faturamento empresarial poderá ocorrer sem a observância da ordem de classificação estabelecida em lei:
1º se o juiz constatar a inexistência dos bens penhoráveis classificados em posição superior; ou, alternativamente, tais bens forem de difícil alienação; ou
2º se a autoridade judicial, conforme as circunstâncias do caso concreto, assim o entender (art. 835, § 1º, do CPC/2015), justificando-a por decisão devidamente fundamentada.
Legislação citada:
CPC, Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.
§ único. Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados.
CPC. Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:
I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;
II – títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado;
III – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;
IV – veículos de via terrestre;
IX – ações e quotas de sociedades simples e empresárias;
X – percentual do faturamento de empresa devedora;
XI – pedras e metais preciosos;
XII – direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;
§ 1º É prioritária a penhora em dinheiro, podendo o juiz, nas demais hipóteses, alterar a ordem prevista no caput de acordo com as circunstâncias do caso concreto.
§ 2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.
§ 3º Na execução de crédito com garantia real, a penhora recairá sobre a coisa dada em garantia, e, se a coisa pertencer a terceiro garantidor, este também será intimado da penhora.
Lei 6.830/1980. Art. 11. A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:
II – título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa;
III – pedras e metais preciosos;
§ 1º Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção.
§ 2º A penhora efetuada em dinheiro será convertida no depósito de que trata o inciso I do artigo 9º.
§ 3º O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública exequente, sempre que esta o requerer, em qualquer fase do processo.
CTN. Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial.
§ 1º A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite.
§ 2º Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido.
DIREITO CIVIL
RESPONSABILIDADE CIVIL
Inf. 809/2024. Serviços bancários. Demora em fila. Legislação específica. Dano moral in re ipsa. Inexistência. Necessidade de demonstrar o dano e nexo de causalidade (Tema 1156).
O simples descumprimento do prazo estabelecido em legislação específica para a prestação de serviços bancários não gera por si só dano moral in re ipsa.
REsp 1.962.275-GO, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por maioria, julgado em 24/4/2024, DJe 29/4/2024. (Tema 1156).
Caso: Espera em fila de banco acima do limite estimado legalmente e o direito do usuário em requerer danos morais.
Pontos importantes:
Teoria do desvio produtivo: A perda de tempo quando injusta e ilegítima pode ensejar ilícito, desde que este seja comprovado, a partir da postura leniente do fornecedor de serviços e do nexo causal entre esta e o efetivo prejuízo causado ao consumidor.
Violação ao direito da personalidade. Meio de prova.
- O atraso em virtude de uma fila, por si só, não tem o condão de ofender direito de personalidade do consumidor dos serviços bancários.
- Compete ao consumidor que aguarda em fila de banco demonstrar qual é de fato o prejuízo que está sofrendo e se não haveria como buscar alternativas para a solução do problema, tal como caixas eletrônicos e serviços de internet banking (autosserviço). A mera alegação genérica de que se está deixando de cumprir compromissos diários, profissionais, de lazer e de descanso, sem a comprovação efetiva do dano, possibilita verdadeiro abuso na interposição de ações por indenização em decorrência de supostos danos morais.
Responsabilização civil:
- O mero transcurso do tempo, por si só, não impõe um dever obrigacional de ressarcimento, por não configurar, de plano, uma prática abusiva a acarretar uma compensação pecuniária, como pressupõe a teoria do desvio produtivo, que considera a perda de tempo útil uma espécie de direito de personalidade irrenunciável do indivíduo.
- Indenizar meros aborrecimentos do cotidiano tem o potencial de banalizar o que se entende por dano moral, cuja valoração não pode ser genérica nem dissociada da situação concreta, sob pena de ensejar uma lesão abstrata, e, por outro lado, tarifação, que é vedada nos termos da Súmula n. 281/STJ (a indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na lei de imprensa).
Conclusão: O simples descumprimento do prazo estabelecido em legislação específica para a prestação de serviços bancários aos usuários não gera por si só dano moral in re ipsa.
SEGURO DE VIDA
Inf. 809/2024. Seguro de vida. Cláusula de sobrevivência dotal. Resgate pelo segurado em vida. Possibilidade. Natureza complexa. Prazo de prescrição decenal.
Aplica-se o prazo de prescrição decenal à ação que visa ao reconhecimento do direito ao resgate, após o prazo assinado em contrato, de capital segurado de seguro de vida com cláusula de sobrevivência.
REsp 1.678.432-RJ, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024.
Caso: A controvérsia refere-se à prescrição de ação indenizatória movida por segurada contra seguradora em razão de suposto descumprimento de cláusula de contratos individuais de seguro de vida dotal com cláusula de sobrevida.
Pontos importantes:
Seguro de vida.
- O seguro de vida é um tipo de seguro de pessoas com cobertura de riscos cujo objetivo é garantir indenização a segurado ou a seus beneficiários nos termos das condições e garantias contratualmente estabelecidas.
- A cobertura por sobrevivência oferecida em seguros de vida é estruturada sob regime financeiro de capitalização e tem por finalidade o pagamento do capital segurado, de uma única vez ou em forma de renda, após atingido o período de diferimento previsto no contrato. O plano dotal, que pode ser puro, misto ou misto com performance, constitui um dos tipos de contrato de seguro de vida por sobrevivência.
- O contrato de seguro individual de vida com cláusula de sobrevivência tem natureza complexa, visto que o capital de segurado pode ser pago aos beneficiários quando do falecimento do segurado, ao qual é permitido optar por resgatar, em vida, o valor econômico capitalizado após transcorrido o período de diferimento.
Prescrição
- Contrato de seguro sem cláusula de sobrevivência – IAC n. 2; REsp n. 1.303.374/ES: “é ânuo o prazo prescricional para exercício de qualquer pretensão do segurado em face do segurador- e vice-versa- baseada em suposto inadimplemento de deveres (principais, secundários ou anexos) derivados do contrato de seguro, ex vi do disposto no artigo 206, § 1º, II, ‘b’, do Código Civil de 2002 (artigo 178, § 6º, II, do Código Civil de 1916)”.
- No contrato de seguro individual de vida com cláusula de sobrevivência, o pagamento do capital segurado não se dá apenas pelo falecimento do segurado, porquanto, há importância de valor econômico capitalizado passível de ser resgatado em vida, o que evidencia, nessa parte, a natureza pessoal do contrato, a atrair a incidência do art. 177, IV, do CC/1916, ou seja, o prazo decenal, como previsto no art. 205 do CC/2002, respeitado o art. 2.028 do mesmo diploma.
Conclusão: Aplica-se o prazo decenal, e não a prescrição ânua do art. 206, II, do Código Civil, à ação que visa ao reconhecimento do direito ao resgate, após o prazo assinado em contrato, de capital segurado de seguro de vida com cláusula de sobrevivência.
Legislação citada:
CC. Art. 205. A prescrição ocorre em 10 anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.
CC. Art. 206. Prescreve: § 1º Em 1 ano: II – a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo: a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador; b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão.
CC. Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
BUSCA E APREENSÃO.
Crime tributário. Busca e apreensão realizada em endereço não abarcado no mandado judicial. Operação extraordinária. Extrapolação dos limites da fiscalização rotineira. Autorização judicial. Necessidade.
Extrapola a atuação de rotina dos órgãos de polícia fazendária, a exigir o controle jurisdicional prévio do ato, quando se evidencia a realização de verdadeira força-tarefa entre diferentes órgãos de polícia e fiscalizatórios.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 2/4/2024, DJe 8/4/2024.
Pontos importantes:
Controle jurisdicional:
- O controle jurisdicional prévio do ato restritivo é imprescindível para se alcançar a legalidade de medidas extremas, como a de busca e apreensão com violação de domicílio, ainda que empresarial.
- Não há como justificar a atuação conjunta de órgãos de polícia autônomos e independentes entre si – Receita Federal, Polícia Federal e Ministério Público – com a finalidade de busca e apreensão de diversos objetos, bens e valores sem o devido controle jurisdicional do ato.
CUIDADO! A situação em análise não se enquadra na jurisprudência do STJ que entende que a administração fazendária, no exercício da sua missão institucional, não necessita de autorização judicial para apreender documentos que considere relevantes na configuração de ilícito, tendo em vista a publicidade dos livros e documentos contábeis (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.124.517/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, DJe de 14/5/2021).
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
Interceptação telefônica. Fundamentação concreta da decisão que autoriza a medida. Observância.
A interceptação telefônica demanda ordem judicial fundamentada em elementos concretos que justifiquem sua necessidade, bem como que afastem a possibilidade de obtenção das provas por outros meios.
AgRg no RHC 183.085-SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 16/4/2024, DJe 19/4/2024.
pontos importantes:
Interceptação telefônica: O Superior Tribunal de Justiça entende que é lícita a autorização para interceptação telefônica quando observados os ditames normativos previstos na Lei n. 9.296/1996 e, dentre eles, o de haver indícios razoáveis da prática de delitos penais punidos com reclusão e não haver possibilidade de a prova ser obtida por outros meios.
Decisão correlacionada: “é firme a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que, em se tratando alegada violação ao art. 2°, II, da Lei n. 9.296/1996, cabe a defesa demonstrar se realmente haviam outros meios de provas disponíveis para a apuração dos fatos ao tempo do requerimento da quebra do sigilo telefônico, o que não ocorreu na espécie” (AgRg no AREsp n. 830.337/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 6/3/2019).
Legislação citada:
Lei 9.296/1996. Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:
I – não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;
II – a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;
III – o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.
§ único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.
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